A alma da festa
É comum ouvir que certas pessoas são a alma da festa: transbordam alegria contagiante por onde passam.
Mas, também é comum ouvir que essas pessoas transbordantes fazem esforços descomunais para não dar mostras dos vários lados que a vida lhes cobra, sobretudo, o lado da dor. É que também elas têm problemas, embora, jurem que não os tenham. Apresentam sempre um rosto alegre, descontraído, descuidado, jovial. Mas isso pode esconder necessidades profundas.
Sabemos que a vida não é fácil, e há um lado dela do qual queremos escapar. Nem sempre, porém, a solução das angústias se encontra num rosto bem cuidado, que não permite revelar o quanto estejamos interiormente perturbados por ansiedades e medos avassaladores, preocupações relativas a doenças, finanças, problemas de trabalho, discussões familiares…
O melhor de ser a alma da festa é continuar sendo a alma da própria festa, mesmo estando sozinho.
Evitar qualquer forma de solidão indica o medo de que, nessa situação, os problemas reprimidos venham à tona. Se o meio de evitar a solidão for se atirar a atividades, empreendimentos, sociedades, trabalhos paroquiais, organizações de caridade… OK. Tudo isso é bom, também. Mas, só isso, cansa e esgota, a si mesmo e aos outros.
Algumas euforias lembram um potente farol aceso na estrada escura: à frente, toda luz; atrás, toda treva. Esconder ansiedades torturantes por detrás da fachada de “alma-da-festa” pode levar ao desânimo e à desistência, bem no meio de projetos que não chegaram a termo.
Há quem prefira a amplidão à profundidade.
Pode ser bom. A menos que não passe a vida toda voando feito borboleta, de flor em flor, num voo trêmulo, que nunca se decide onde irá se sentar. Sem mais nem menos, pode levantar voo, e ir atrás de outra flor.
Artigo de Dom José Francisco Rezende Dias, Arcebispo de Niterói e Presidente do Regional Leste 1 – CNBB