O mês de novembro, além da celebração dos fiéis falecidos, lembra também todos os santos. Faz-se festa na terra por todos aqueles que alcançaram a meta da perfeição de Deus, a santidade.
Quando se fala de santidade, costuma-se ter uma ideia de perfeição moral. O santo é visto muitas vezes como uma pessoa irrepreensível, de quem não se pode falar nada em contra. Lembro-me ter lido anos atrás um livro com um título muito sugestivo: “Os defeitos dos santos”. Quem sabe alguém pode se pasmar, mas os santos também tinham os seus defeitos, seus equívocos. No entanto, eram pessoas que não desanimavam diante dos obstáculos, nem mesmo quando se tratava de suas imperfeições pessoais. Certa vez ouvi uma definição de santo que é bem justa: um pecador que não desiste de lutar.
Por outro lado, os santos fazem parte com muita frequência da nossa experiência. Nós os recordamos e invocamos nas diversas necessidades, gostamos de ouvir as histórias de suas vidas e as canonizações de pessoas que foram nossas contemporâneas nos dão a ideia de uma proximidade maior do que antes. Temos assistido canonizações de homens e mulheres com os quais muitas pessoas que ainda vivem, conheceram e conviveram.
Uma das grandes redescobertas do Concílio Vaticano II foi o chamado universal à santidade, ou seja, que todos pela força do Batismo, podem alcançar aquela perfeição do amor a Deus e ao próximo que está no coração do Evangelho. Esta perfeição é mais de Deus do que nossa, por isso os santos são transparência da ação de Deus na vida do mundo. A santidade não é privilégio de uma elite, mas está ao alcance de todos pela ação da graça divina, que opera no coração das mulheres e dos homens e também pela decidida correspondência de cada pessoa à ação divina. Ela se mostra “no povo paciente de Deus: nos pais que criam os seus filhos com tanto amor, nos homens e mulheres que trabalham a fim de trazer o pão para casa, nos doentes, nas consagradas idosas que continuam a sorrir” (Francisco, Gaudete et exultate, n. 7). Com essas palavras do Papa Francisco vemos que a santidade tem a ver com a vida cotidiana.
Uma certo tipo de iconografia dos santos representaram-nos modo a causar a impressão de que a santidade não tem a ver com as realidades desse nosso mundo, que é coisa de gente muito especial. Nada mais falso do que isso. Ser santo é uma realidade que se realiza a partir daquilo que se vive na existência simples do dia a dia. Um dos grandes pregadores da mensagem da vocação universal à santidade no século XX dizia que “Deus nos espera cada dia: no laboratório, na sala de operações de um hospital, no quartel, na cátedra universitária, na fábrica, na oficina, no campo, no seio do lar e em todo o imenso panorama do trabalho. Não esqueçamos nunca: há algo de santo, de divino, escondido nas situações mais comuns, algo que a cada um de nós compete descobrir.” (São Josemaria Escrivá).
Os santos são as melhores testemunhas da atualidade do Evangelho, pois suas vidas são Evangelho vivido no contexto das atuais circunstâncias. Eles e elas conseguiram traduzir no modo de ser, falar, pensar, agir, a mente de Cristo e, sobretudo, o seu amor. Por meio deles a pregação do Evangelho é mais eficiente e capaz de tocar em profundidade a vida das pessoas.
Os que conviveram com os santos, mesmo sem saber que eles eram santos, testemunham que estiveram diante de alguém cuja humanidade era única. E de fato é assim, pois na humanidade dos santos se toca a humanidade de Cristo e isso é sempre surpreendente e capaz de transformar a vida, dando-lhe sentido novo, sentido autêntico.
Artigo de dom Gilson Andrada da Silva, bispo de Nova Iguaçu (RJ)