Santa Dulce: um “anjo bom” para o Brasil

outubro 13, 2019 / no comments

Estou tendo a graça de participar em Roma da canonização da nossa querida Ir. Dulce, popularmente conhecida como o Anjo Bom da Bahia. Pelas ruas de Roma tenho encontrado muitas pessoas, várias delas emocionadas por ver a foto da mais nova santa brasileira entre as colunas da fachada da Basílica de São Pedro no Vaticano. Algumas dessas pessoas conheceram Ir. Dulce em vida e não resistem em dar seu testemunho alegre, pois um dia tiveram contato com ela, conheceram uma santa e agora se dão conta de que os santos estão tão perto. Outras muitas, e eu me incluo entre elas, falam da convicção de que se estão em Roma nesses dias é porque ela os trouxe.

Mas a sua canonização interessa para além desses fatos existenciais. A santidade dos amigos de Deus fala de vida que se eterniza quando entra na dinâmica do dom. A vida é dom que se realiza na capacidade de se doar. Em uma época onde o valor da vida humana aparece tão transcurado, os santos da misericórdia, como Ir. Dulce, falam de vidas que encontram seu sentido e se realizam na alegria de pensar e agir em favor do outro que é desvalorizado, diminuído e desprezado. Ir. Dulce dedicou todas as suas pobre forças humanas e toda a grandeza do seu coração a ouvir o clamor que vinha dos miseráveis que jaziam nos caminhos por onde ela andava. Sua fragilidade foi instrumento da força do amor de Deus.

Desde jovenzinha deu largas aos apelos que Deus lhe fazia no fundo da alma. Ainda na casa dos pais, quis acolher doentes e mendigos, transformando sua casa em “portaria de São Francisco”, como ficou conhecida. Depois, como religiosa da Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Mãe de Deus, não se cansou de empreender iniciativas para socorrer os mais pobres entre os pobres das periferias de Salvador. Iniciativas que ainda hoje estendem o bem que ela fez enquanto esteve entre nós. Soube também comprometer muita gente em favor dos pobres. Criou uma verdadeira rede de solidariedade ao seu redor. E agora estamos em Roma e, a partir daqui, no mundo inteiro, agradecendo a Deus o seu belo testemunho.

Saindo na manhã do sábado, 12 de outubro, da Basílica de São Pedro, demorei-me ao contemplar a foto da nossa santa, disposta entre duas colunas da fachada do majestoso templo vaticano.  Aquela imagem sugere muita reflexão. A caridade tem consequências que alcançam o mundo inteiro. Uma freirinha que andava pelas ruas da capital baiana, pedindo esmolas para os seus pobres, muitas vezes à custa de muita humilhação, agora é venerada no mundo inteiro com esse gesto que o Papa Francisco faz ao declarar sua santidade. Quantas pessoas no mundo serão tocadas e inspiradas pelo seu exemplo! Sim, a santidade deve ser colocada no lugar mais alto da vida da Igreja. Ela é capaz de iluminar mais do que as trevas são capazes de escurecer e ocultar a beleza de Cristo na sua Igreja. A caridade, como aquelas colunas, faz a Igreja sustentar a vida dos frágeis, mas, ao mesmo tempo, é ela que sustenta a própria Igreja.

A caridade revela Deus presente, Deus que se importa diante do sofrimento da humanidade. A caridade autêntica, vivida no amor a Deus manifestado no concreto da vida dos irmãos mais necessitados, manifesta a presença de um Deus cheio de bondade e misericórdia e O revela sempre perto. Ir. Dulce, sem nenhuma pretensão pessoal soube ser sinal de um Deus que não quer a morte dos seus filhos e encontra muitas mãos para alcançá-los nas suas grandes misérias.

Que o anjo bom da Bahia seja para todo o Brasil um sinal de que Deus envia ainda hoje anjos para guardar o seu povo em meio à tentação da desesperança. A exemplo de Ir. Dulce, multipliquemos os sinais de bondade, pois, como ela dizia, “o importante é fazer a caridade, não falar de caridade. Compreender o trabalho em favor dos necessitados como missão escolhida por Deus”.

 

Artigo de dom Gilson Andrade da Silva, bispo de Nova Iguaçu e Vice-presidente do Regional Leste 1 – CNBB