CNBB conclama a sociedade e os responsáveis pelos poderes públicos a se unirem à prevenção e ao combate à Covid-19

abril 30, 2020 / no comments

POSICIONAMENTO DA CNBB EM DEFESA DA DEMOCRACIA, PELA JUSTIÇA E PELA PAZ!

 

“Parai de fazer o mal, aprendei a fazer o bem: buscai o direito, socorrei o oprimido,
fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva. Então, sim, podemos discutir” (Is 1,16b-18a).

 

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB, por meio do seu Conselho Episcopal Pastoral, reafirma, com veemência, seu compromisso com o “Pacto pela Vida e pelo Brasil”, de 7 de abril passado, assinado inicialmente por seis respeitadas instituições da sociedade civil e, posteriormente, por mais de 150 entidades, considerando que “a hora é grave e clama por liderança ética, arrojada, humanística, que ecoe um pacto firmado por toda a sociedade, como compromisso e bússola para a superação da crise atual”.

Diante da mais grave crise sanitária dos últimos tempos, com o sistema de saúde já entrando na fase de colapso, consideramos este momento dificílimo, que clama pelo efetivo exercício da solidariedade e da caridade. É tempo das palavras e atitudes serenas de paz, de fé e de esperança, de respeito às leis e à democracia. É com perplexidade e indignação que assistimos manifestações violentas contra as medidas de prevenção ao coronavírus; que ouvimos declarações enviesadas de desprezo pela vida, por parte de agentes públicos sobre a morte de milhares de brasileiros e brasileiras contaminados pelo covid-19; que vimos acontecer eventos atentatórios à ordem constitucional, com a participação de autoridades públicas, onde se defendeu o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, a volta do AI-5 e o retorno aos sombrios tempos da ditadura; que todo o Brasil soube de denúncias acerca da politização da justiça, ferindo sua necessária autonomia de investigação.

A Doutrina Social da Igreja ensina, com clareza a intocável harmonia e cooperação entre os Poderes, base constitutiva da República, garantia do Estado Democrático de Direito, o princípio de que “é preferível que cada poder seja equilibrado por outros poderes e outras esferas de competência que o mantenham no seu justo limite. Este é o princípio do ‘Estado de direito’, no qual é soberana a lei, e não a vontade arbitrária dos homens.” (CDSI, 408).

Portanto, buscar soluções para os problemas do Brasil fora da institucionalidade democrática e em confronto com os poderes da República, coloca em risco a democracia e a integridade do povo brasileiro. Nessa perspectiva, não são toleráveis as manifestações sociais que atentam contra a Constituição, assim como não é tolerável que qualquer autoridade viole os preceitos constitucionais e despreze a vida. Espera-se das instituições republicanas, garantidoras do Estado de direito, a devida responsabilização dos que atentam contra a ordem democrática.

Reiterando o posicionamento contido no “Pacto pela Vida e pelo Brasil”, a CNBB conclama a sociedade e os responsáveis pelos poderes públicos a se libertarem dos vírus mortais da discórdia, da violência, do ódio e a se unirem no único confronto que a todos nos interessa nesse momento: a prevenção e o combate à Covid-19, em defesa da vida, especialmente a dos mais pobres e vulneráveis.

O cuidado da saúde das pessoas e da economia são fundamentais para a garantia da vida em sua plenitude e não se opõem. Na perspectiva da Doutrina Social da Igreja, a economia está a serviço da vida: “o princípio da destinação universal dos bens convida a cultivar uma visão da economia inspirada em valores morais que permitam nunca perder de vista nem a origem, nem a finalidade de tais bens, de modo a realizar um mundo equitativo e solidário, em que a formação da riqueza possa assumir uma função positiva.” (CDSI, 174).

Sob a proteção de Nossa Senhora Aparecida, Maria, mãe discípula de Jesus, irmanamo-nos na luta empenhada por justiça e paz e pela democracia plena, onde deve prevalecer o bem comum e a dignidade de cada pessoa, como partícipe da construção de uma nova sociedade marcada pela solidariedade, como nos ensina o Papa Francisco: “o risco é que possamos ser atingidos por um vírus ainda pior, o da indiferença egoísta. Um vírus que se espalha pelo pensamento de que a vida é melhor se for melhor para mim e que tudo ficará bem se for bom para mim.” (Papa Francisco, 19/04/2020).

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo

Arcebispo de Belo Horizonte (MG)

Presidente da CNBB

Dom Jaime Spengler, OFM

Arcebispo de Porto Alegre (RS)

1º Vice-Presidente

Dom Mário Antônio da Silva

Bispo de Roraima (RR)

2º Vice-Presidente

Dom Joel Portella Amado

Bispo Auxiliar de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)

Secretário-Geral da CNBB

A oportunidade do momento presente

abril 25, 2020 / no comments

Um trecho dos Atos dos Apóstolos, lido recentemente na liturgia pascal, nos conta como os apóstolos, colocados na prisão por causa do testemunho do Evangelho, foram milagrosamente libertos por um anjo que lhes abriu uma porta e lhes ordenou que fossem contar ao povo, no Templo, tudo o que se referia àquele novo modo de viver (cf. At 5, 17-26).

O contexto desfavorável para a missão, naquela primeira hora da comunidade cristã, foi transformado em oportunidade. A Providência divina encontra meios de abrir portas às prisões que nos são impostas. Lembro-me do relato de um frade dominicano que tendo sido designado para uma missão em Cuba, espantou-se ao ver o sorriso das pessoas do local, enquanto passavam fortes restrições de todo o tipo, devido ao regime ditatorial que enfrentavam. Ele perguntou a uma pessoa sobre como ela continuava mantendo o sorriso numa situação tão deprimente. Ela então respondeu: “o sorriso é o que temos, o que nos resta. E isso não podem nos tirar”.

Há sempre um espaço que não deixa de ser nosso. Precisamos tomar consciência disso e apossar-nos daquilo que temos como oportunidade em qualquer situação que atravessamos na vida. Há sempre algo a adicionar quando parece que só estamos perdendo.

Ouvi alguém comentar que as pessoas estão se reinventando, no contexto da pandemia. Reinventar-se para não se paralisar na lamentação. Nada mais cristão do que o velho ditado: “fazer limonada com o limão que a vida oferece”. Talvez alguém diga que essas palavras caberiam bem em um livro de autoajuda, mas não diante do que está acontecendo. É bom lembrar que as pandemias registradas na história foram também ocasião de fortalecimento e progresso para a humanidade e não apenas de sofrimento.

Além disso, o espírito cristão tem seu apoio na fé no Cristo Ressuscitado, vencedor do pecado, do mal e da morte. A visão que o cristianismo tem do mundo e da história possuia sua base na fé na criação e na nova criação inaugurada por Cristo. Por isso, é próprio do cristão abraçar a humanidade com otimismo e esperança. A atual urgência sanitária desafia a nossa visão acerca de tudo,desde o modo como nos relacionamos com a natureza ao aspecto mais importante das relações com Deus e entre nós. Esta pandemia pode nos ajudar a retornar à base daquilo que, de fato, somos, sem retrocessos diante das autênticas conquistas da humanidade.

Nas encruzilhadas da vida, Deus se encarrega de se aproximar de nós e nos ajudar a ver que se pode abrir uma estrada no deserto, que há sempre um novo caminho que pode ser percorrido. Podemos, talvez, nos paralisar diante da pergunta que todos nós fazemos: até quando isso vai se prolongar? É fácil parar aqui e procurar ajeitar as coisas simplesmente esperando a tempestade passar. Na verdade, não sabemos muito sobre o tempo, mas sabemos que temos esta hora, este momento. O agora é ocasião de cuidados, de restrições, de sobressaltos econômicos, e de tantas outras coisas que estamos enfrentando, cada um a seu modo. Mas o agora é o que temos e não o depois, aproveitemo-lo! Fujamos da tentação de procurar refúgio no passado ou da fuga imaginária para um futuro que sequer sabemos se será ou não o nosso.

O Evangelho nos oferece a sabedoria de aproveitar como oportunidade o momento presente: “a cada dia basta o seu cuidado” (Mt 6, 34).