Mãe:ternura capaz de curar o mundo

maio 9, 2021 / no comments

Mãe:ternura capaz de curar o mundo

As leituras da Palavra de Deus deste 6º Domingo do Tempo Pascal trazem uma mensagem que vem ao encontro da celebração que hoje ilumina o 2º domingo do mês de maio: o dia das mães. No centro da mensagem está uma realidade antiga e sempre nova: o amor. Jesus diz aos discípulos que o seu mandamento é que se amem uns aos outros como Ele os amou (Jo 15). Deus amou o mundo de forma concreta enviando o seu Filho para salvar a humanidade de seus descaminhos, sendo o maior deles o pecado de não reconhecer o amor de Deus, fonte do amor entre nós.

A figura da mãe torna próxima a imagem de um Deus que é amor. Ele mesmo usa imagens maternas para traduzir seu modo único e excepcional de amar. A maternidade autêntica é tradução de um amor sempre novo porque sempre atualizado nas circunstâncias diárias.

Assim é o amor, cheio de novidade. Ele nunca envelhece,pois lhe é próprio ser tarefa cotidiana e existe à medida que se renova em gestos frequentes.É de tal modo criativo que é capaz de explicar o sentido de toda uma vida. É sábia a afirmação do grande psiquiatra e fundador da Logoterapia, ViktorFrankl, de que o sentido da vida é dar a vida por alguém ou por uma causa. Jesus diz, no Evangelho lido hoje nas missas, que não há maior amor do que dar a vida pelo amigo.

As mães nos ajudam a confirmar essa realidadequando encontramos no simples fato de ser mãe a explicação para uma vida toda doada em mil detalhes e sacrifícios.Amor de mãe é amor de doação: gera, dá a vida e se compromete com ela ao longo de toda a existência. Nada mais contrário ao amor do que fechar-se em si mesmo e buscar os próprios interesses.Por isso, afirma o Papa Francisco que “as mães são o antídoto mais forte contra a propagação do individualismo egoísta” (Catequese de 7 de janeiro de 2015). Só um amor assim pode ser capaz de curar o mundo doente em que vivemos.

Nesta semana fomos tristemente surpreendidos por notícias de violência que estarreceram o país. Em Santa Catarina, 5 pessoas, dentre elas 3 crianças, foram brutalmente assassinadas por um jovem de 18 anos. No Rio de Janeiro, uma ação policial resultou em 29 mortes. Não se trata apenas de números, mas de pessoas, imagem de Deus,cada um com sua história concreta, independentemente de outros juízos que legitimamente pudéssemos fazer de suas vidas. São sintomas de um mundo que há tempos tem relativizado o valor da vidahumana.

Do modo de amar próprio de uma Mãe se aprende que cada pessoa é única e sagrada. Ela sabe ter amor exclusivo para cada filho, apesar de amar a todos. Desse modo, cada filho pode dizer que a mãe o ama de modo único, e isso é verdade. Por isso, uma mãe, mesmo sendo capaz de julgar os acertos e os erros de seus filhos, não desiste deles, mas conserva sempre viva a esperança, pois sabe que a força do amor é a única capaz de revolucionar a vida pessoal e a história.

Acertadamente diz o Papa Francisco que “uma sociedade sem mães seria uma sociedade desumana, porque as mães sabem testemunhar sempre, mesmo nos piores momentos, a ternura, a dedicação, a força moral.” (Catequese de 28 de janeiro de 2015)

Que a figura materna inspire nossas atitudes de acolhida generosa do dom da vida de cada pessoa humana, levando-nos a superar a onda crescente de ódio e violência que ameaça nossas relações. Agradecidos por sua persistência no amor, pedimos a Deus por elas e que o seu exemplo nos ajudea reencontrar a força do caminho da ternura.

Feliz dia das mães!

 

Artigo de Dom Gilson Andrade da Silva, bispo de Nova Iguaçu e Vice-presidente do Regional Leste 1 – CNBB.

A Páscoa e as noites da história

abril 4, 2021 / no comments

A Páscoa e as noites da história

 

No domingo de Páscoa iremos à Missa, cada um da maneira que puder. Uns presencialmente, outros, através de alguma transmissão por causa da pandemia, mas o normal é que nós cristãos católicos reservamos o domingo de Páscoa para a participação presencial na Santa Missa.

Um costume iniciado por aqueles que tiveram a alegria de encontrar o Senhor ressuscitado e que se tornou um legado para todas as gerações cristãs. Os cristãos vivem do Dia do Senhor (o Domingo), porque vivem da sua Palavra e do seu Pão eucarístico. Os mártires de Abissínia (África), no século IV, durante a severa perseguição de Diocleciano, presos por terem participado de uma Missa dominical, enquanto sofriam as torturas que os levariam ao martírio gritaram: “Sine dominico non possumus” (“Não podemos viver sem o dia do Senhor”).

Este domingo da Páscoa, e cada domingo, é memória viva, não apenas vaga recordação, do dia da ressurreição do Senhor. Ele traz a força de renovar todas as coisas, de reconciliar a humanidade com Deus, com o cosmos e com os seres humanos entre si. É o dia da renovação da criação que, depois, é atualizada, toma corpo, no cotidiano da vida. Trata-se de um dia da semana que renova as forças e as esperanças e nos oferece “pernas” para correr pelos caminhos da vida com a fé sempre acesa, iluminando tudo e todos.

Foi assim naquele primeiro domingo de Páscoa que hoje recordamos. Diz São João que Maria Madalena foi ao sepulcro quando ainda estava escuro (Jo 20, 1). Não se trata apenas de uma constatação temporal. Nesta sua ida, ela se depara com a surpresa de Deus. Mesmo se está escuro, se o dia ainda não amanheceu, o “Sol da justiça”, Jesus, vem ao nosso encontro. Ele se torna presente à humanidade mesmo se tudo ao nosso redor é noite. Deus caminha ao nosso lado nas noites da história.

É verdade que nos sentimos mergulhados em uma grande noite. As notícias que ouvimos e o que presenciamos perto de nós nos preocupam e nos tentam para o medo. Mas é Páscoa, a luz de Deus surpreendentemente irrompe na noite e a Vida se impõe como vencedora da morte.

São Paulo vai exclamar: “Ó morte, onde está a tua vitória?” (1 Cor 15, 55). A Igreja, na Sequência da Liturgia deste domingo vai cantar: “Morte e vida duelam”; “Duelam forte e mais forte. É a vida que enfrenta a morte. O Rei da vida, cativo, é morto, mas reina vivo!”.

Maria Madalena caminha na noite, mas retorna aos seus com uma luz inesperada. Constata que a grande pedra, rolada à entrada do túmulo, foi retirada. Não foi ela que o fez. Está escuro, mas o obstáculo desapareceu. Deus não deixa de nos dar sinais de sua presença e, assim, animar a nossa esperança.

A Madalena se agarra a esse “fiapo” de esperança e começa uma corrida: “saiu correndo e foi encontrar Simão Pedro e o discípulo que Jesus amava” (Jo 20, 2). Os dois apóstolos, por sua vez, também eles se lançaram numa corrida para percorrer o mesmo itinerário da Madalena e constatar o fato mais importante da história, a Ressurreição de Jesus.

A Ressurreição não é uma simples crença, mas um fato que deixou marcas de uma esperança certa na história. Deus venceu a noite e fez surgir o “Sol da justiça” para sempre.

Neste momento difícil que estamos atravessando, como Madalena e os Apóstolos precisamos “correr” ao encontro de quem pode estar perdendo a esperança e oferecer com humildade, mas sem medo, a luz da fé na Ressurreição que livra a vida da falta de sentido e garante vida nova. Hoje Deus está a visitar a noite da nossa história, demos espaço para a esperança que só Ele pode nos trazer.

 

Artigo de Dom Gilson Andrade da Silva, bispo de Nova Iguaçu e Vice-presidente do Regional Leste 1 – CNBB.