Dom Gilson Andrade da Silva emite nota de esclarecimento para o bem espiritual e pastoral dos fiéis da diocese de Nova Iguaçu (RJ).
Dom Gilson Andrade da Silva emite nota de esclarecimento para o bem espiritual e pastoral dos fiéis da diocese de Nova Iguaçu (RJ).
“A paz esteja nesta casa”(Lc10, 5)
Com estas palavras de Jesus, ao enviar seus discípulos em missão, gostaria de manifestar o desejo de paz do meu coração de Pastor ao querido povo de Deus dos 7 municípios que compõem a Diocese de Nova Iguaçu, e às pessoas de boa vontade, nesta hora em que a violência parece incontrolável e atinge a tanta gente inocente, atinge a todos nós.
As recentes chacinas em Nova Iguaçu (13 de fevereiro) e Belford Roxo (29 de junho) ganharam repercussão na imprensa, mas sabemos que muitos outros casos sequer chegam ao conhecimento do grande público. Acompanhamos com preocupação as notícias diárias do crescimento endêmico da violência em nossa querida, mas sofrida Baixada Fluminense, com aspectos de uma verdadeira crise civilizacional. Não me proponho aqui a falar de causas, nem enumerar fatos, em parte já os conhecemos e sinceramente os lamentamos.
Através da nossa presença nas paróquias, comunidades e obras sociais quero transmitir o abraço fraterno e de paz da Diocese às vítimas e aos seus familiares.
“Oferecer a paz está no coração da missão dos discípulos de Cristo. E esta oferta é feita a todos os homens e mulheres que, no meio dos dramas e violências da história humana, esperam na paz.” (Francisco, Mensagem para o Dia Mundial da Paz – 2019)
Os esforços em vários âmbitos têm se demonstrado insuficientes para frear uma violência que transforma a todos em vítimas potenciais, mudando os hábitos de convivência e limitando o direito de ir e vir. Não podemos acostumar-nos com o que está acontecendo e ficar indiferentes e paralisados quando vemos que a vida humana, dom sagrado recebido de Deus, é desprezada e tratada como uma realidade banal que pode ser simplesmente eliminada. Temos que nos perguntar: onde está o valor e a dignidade da vida humana? Qual a responsabilidade dos poderes públicos, diante de tamanha violência? Como a mensagem de Cristo pode infundir a esperança em nossos corações? Como a Igreja pode ser um espaço de acolhida, fermento e vida diante desse cenário? Como os jovens, principais vítimas de homicídios, bem como a situação da violência contra a mulher têm recebido a devida e concreta atenção?
Sabemos, por outro lado, que “a paz é fruto de um grande projeto político, que se baseia na responsabilidade mútua e na interdependência dos seres humanos. Mas é também um desafio que requer ser abraçado dia após dia. A paz é uma conversão do coração e da alma, sendo fácil reconhecer três dimensões indissociáveis desta paz interior e comunitária: a paz consigo mesmo, rejeitando a intransigência, a ira e a impaciência e – como aconselhava São Francisco de Sales – cultivando «um pouco de doçura para consigo mesmo», a fim de oferecer «um pouco de doçura aos outros»; a paz com o outro: o familiar, o amigo, o estrangeiro, o pobre, o atribulado…, tendo a ousadia do encontro, para ouvir a mensagem que traz consigo; a paz com a criação, descobrindo a grandeza do dom de Deus e a parte de responsabilidade que compete a cada um de nós, como habitante deste mundo, cidadão e ator do futuro.” (Francisco, Mensagem para o Dia Mundial da Paz – 2019)
Conclamo os fiéis de nossa Diocese a dar a sua contribuição para a construção de um novo tempo de reconciliação e de paz, com iniciativas que favoreçam a oração pela paz e possibilitem processos de reflexão, escuta e construção de alternativas de minimização e superação das violências percebidas. Queremos ser uma Igreja orante que se faz solidária, a exemplo do Bom Samaritano, ao lado de todas as vítimas das várias formas de violência. Que saibamos ser denúncia diante da inversão dos valores cristãos, mas sobretudo, mais do que nunca, anúncio de um jeito novo de ser e de viver. Atenção especial requerem os jovens em um mundo em crise(cf. Exortação Apostólica Christus Vivit, nn. 72 a 80), as mulheres, mães e familiares das vítimas de violência.
Representando muitas vozes quero também dirigir-me aos gestores públicos, responsáveis pelo atendimento direto da população, que percebam a urgência do momento, a relevância e a importância do cargo que lhes foi confiado e que se empenhem ainda mais em exercer a função pública com equidade, justiça e transparência, com atenção especial aos mais pobres e marginalizados.
A Nossa Senhora da Piedade, co-padroeira da nossa Diocese, Mãe aflita e esperançosa que sustenta nos seus braços o Filho morto, aguardando a sua ressurreição, confiamos nosso desejo de um tempo novo de reconciliação e de paz.
Nova Iguaçu, 5 de julho de 2019
Bispo de Nova Iguaçu (RJ)