O Curso Anual dos Bispos do Brasil, já na sua 29ª edição, promovido pela Arquidiocese do Rio de Janeiro, foi realizado no Centro de Estudos do Sumaré, de 27 a 31 de janeiro, tendo como tema: “A dinâmica humana e espiritual da formação permanente dos presbíteros”.
“O curso não é uma assembleia para decisões, mas um tempo em que os bispos aproveitam o período de férias para descansar, rezar e partilhar, num clima de muita fraternidade. Os temas de cada ano são relacionados com a vida da Igreja, quando conferencistas de renome internacional e também do nosso país nos ajudam a pensar e ver como aplicar o conteúdo em nossas dioceses”, explicou o arcebispo anfitrião do Rio, Cardeal Orani João Tempesta.
Abertura
Na cerimônia de abertura, Dom Orani acolheu todos os participantes, agradeceu o empenho do bispo auxiliar emérito do Rio, Dom Karl Josef Romer, que desde o início, no governo de Dom Eugenio de Araujo Sales, tem se preocupado com a organização da temática e o convite aos conferencistas. O mesmo agradecimento fez em relação ao bispo auxiliar do Rio e secretário-geral da CNBB, Dom Joel Portella Amado, pela direção dos trabalhos.
“O Curso dos Bispos tem uma história a serviço da Igreja nos seus 30 anos de existência, embora estejamos realizando a 29ª edição. Não houve curso em 1991, devido à proximidade do curso anterior e, em 2007, devido à Conferência de Aparecida. Neste período, levando em consideração a presença, em média, de cem bispos em cada um, o curso já reuniu 2.900 bispos, embora muitos tenham participado várias vezes. Dedicamos esta edição a Dom Eugenio, ele que foi o idealizador e incentivador do curso, neste ano em que celebramos o centenário de seu nascimento”, disse o arcebispo.
Presenças
O curso contou com a presença de 119 participantes, sendo 66 arcebispos e bispos titulares de dioceses, bispos auxiliares e eméritos, vigários episcopais do Rio, e neste ano, reitores e formadores de seminários, devido à proposta do tema relacionada com a formação dos futuros presbíteros. Dos 18 regionais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), estavam presentes bispos representantes de 14 regionais.
Foi registrada a ausência do Núncio Apostólico, Dom Giovanni d’Aniello, que estava no Estado do Pará, participando das instalações da recém criada Arquidiocese de Santarém e da Diocese de Xingu-Altamira, e na posse de seus respectivos bispos.
Diretrizes
Segundo Dom Orani, as temáticas do curso tiveram como base os documentos “Ratio Fundamentalis”, publicados no dia 8 de dezembro de 2016 pela Congregação para o Clero, e a “Ratio Nacionalis”, aprovada pela Assembleia Geral dos Bispos do Brasil e publicada no dia 12 de outubro de 2019, como Documento nº 110 da CNBB.
“Atrás da sinodalidade e descentralização que tanto fala o Papa Francisco, as orientações são em âmbito mundial e nacional, mas toda essa riqueza precisa ser aproveitada e aplicada para a realidade local. O sacerdote precisa passar regularmente por um processo de atualização, o que chamamos de formação permanente. Com o tempo vão surgindo situações adversas, crises existenciais e de vocação, que precisam ser iluminadas. Na verdade, as situações são oportunidades de crescimento tanto na formação inicial como na permanente. Além da atualização do clero, que é necessária, não se pode deixar de cuidar do seu itinerário pessoal, de fé, psicológico e religioso”, disse Dom Orani.
Pessoa humana
Segundo Dom Joel Portella Amado, após a publicação da “Ratio Fundamentalis”, a Conferência Episcopal do Brasil foi a primeira a fazer as diretrizes em âmbito nacional, a “Ratio Nacionalis” ou o Documento 110 da CNBB. Ele recordou que a formação permanente é um processo muito amplo, eminentemente catecumenal, e que os dois documentos contemplam com destaque o princípio antropológico.
“Dois princípios que sempre estiveram presentes na vida da Igreja, mas que agora sobressaíram nesses dois documentos. A formação é um processo que deve percorrer a vida toda. Não é apenas o tempo de seminário, que é intenso, mas é um tempo curto, levando em consideração que se exerce o sacerdócio, em média, por 60 anos. A formação começa do nascer e vai até o último suspiro. A pessoa humana é mais importante do que qualquer concretização. Antes de ser seminarista ou padre, é um ser humano”, afirmou Dom Joel.
Palestrantes do Curso dos Bispos 2020
Seminários, presbitério e formação permanente
Durante o curso, o arcebispo secretário da Congregação para o Clero, Dom Jorge Carlos Patrón Wong, fez três conferências. Na primeira, “O discipulado como processo de configuração com o Cristo Bom Pastor – sobre a formação e o acompanhamento nos seminários”, ele refletiu em relação à vocação sacerdotal como um único processo que tem na origem o dom da graça divina que se concretiza na ordenação sacramental.
Na segunda conferência, “Espiritualidade, vida e ministério do presbitério diocesano junto ao povo de Deus e ao lado do seu bispo”, ele
fez um resgate de elementos da espiritualidade cristã, comuns a todos os batizados, que estão na base da espiritualidade episcopal e sacerdotal, e que constituem passos na caminhada até o chamado de Deus. Abordou ainda aspectos da espiritualidade episcopal, em vista da paternidade espiritual a qual os bispos são chamados junto a todo o povo confiado, mas, em especial, junto aos sacerdotes.
Na terceira conferência, Dom Jorge Patrón abordou sobre “O processo de acompanhamento dos sacerdotes durante a formação permanente”, que tem um caráter eminentemente comunitário e se desenvolve com a colaboração de um inteiro presbitério e seu pastor.
“A vocação sacerdotal, em si, é para a Igreja e para o mundo um presente de Deus que nasce do seu próprio Coração, mas ela vem gerada no seio de uma comunidade de fiéis que cumpre o mandato de Jesus de rezar incessantemente”, disse Dom Jorge Patrón.
Elaboração do Documento 110 da CNBB
“As diretrizes para a formação dos presbíteros da Igreja no Brasil” foi a conferência feita pelo arcebispo de Porto Alegre (RS), Dom Jaime Spengler, que também é o primeiro vice-presidente da CNBB e membro da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica.
Ele fez a apresentação do processo de elaboração do Documento 110 da CNBB em três tópicos: o histórico, os elementos a serem considerados na sua aplicação e considerações gerais sobre formação.
“Para levar a obra da formação adiante, segundo a tradição da Igreja, cumpre ressaltar três aspectos: compreender bem o contexto (social, histórico e humano) no qual nos encontramos; rezar esta realidade tanto individualmente como também como comunidade de fé; e para levar a termo, a disposição para o diálogo entre os irmãos”, disse Dom Jaime.
Vocação, afetividade, formação
O professor da Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma, padre Stanislaw Morgalla, também diretor do Centro de St. Peter Favre, para formadores do Sacerdócio e da Vida Consagrada, fez três conferências durante o curso.
Na primeira conferência, “Antropologia da vocação cristã”, abordou o paradoxo da vida cristã no seu contexto antropológico, espiritual e aspectos psicológicos.
Na conferência “Celibato e obediência do sacerdote, em meio aos desafios da vida cotidiana”, refletiu sobre o modo de viver a afetividade (sexualidade), em virtude da opção vocacional.
Na terceira conferência, “A formação inicial e permanente, uma realidade unitária”, disse que não é possível separar a formação permanente do presbítero da sua formação inicial. “Não se pode tratar uma sem a outra”, afirmou.
Saúde emocional do presbítero
Na sua conferência, “O esgotamento existencial dos presbíteros: causas e pistas para ação das dioceses na prevenção e tratamento”, a psicóloga Luciana Campos, professora no Seminário São José, em Niterói, e autora de vários livros sobre o assunto, partilhou sua experiência no atendimento a sacerdotes de todo o Brasil.
“A Síndrome de Burnout é o esgotamento emocional, psíquico e laboral oriundo pelo excesso de trabalho. As pessoas em geral não imaginam que os sacerdotes são acometidos por esses problemas, por isso a importância de dar visibilidade à temática”, disse.
A psicóloga contou que procura ajudar os sacerdotes a serem menos centralizadores, aprenderem a delegar e confiarem nos outros, porque é impossível uma pessoa só dar conta de tudo.
“Preparado para ser pastor 24 horas por dia, o sacerdote é sugado todo tempo e se dá desmedidamente, até que começa a sentir os efeitos dessa doação desacerbada. Muitas vezes, ele começa a se sentir frustrado, irritado e perdido a ponto de se isolar, a ter crise de fé e de questionar a própria vocação”.
Segundo Luciana Campos, a Síndrome de Burnout é uma doença silenciosa e, para não deixar que ela se instale, é preciso mudanças, ter uma agenda com horários específicos.
“Precisa fazer parte da agenda momentos de descanso, lazer e, principalmente, de socialização. Se faz necessária a socialização com seus pares para discutir sobre problemas comuns e caminhos para o resgate da saúde emocional”, disse a psicóloga.
Segundo Dom Orani, o sacerdote também tem suas necessidades e limitações, e às vezes acaba se irritando e ficando tenso com algumas situações que enfrenta e, por isso, a necessidade de alguém que compreenda e ajude o sacerdote a dar passos.
“Só seremos perfeitos no céu. Enquanto estamos aqui, precisamos nos ajudar mutuamente. Por isso, a necessidade de rezar, compreender e acompanhar a vida e a missão do sacerdote, e neste aspecto, a comunidade paroquial pode ajudar a transformar a realidade”, disse o arcebispo.
Direção espiritual
A última conferência do curso, “A escuta e a direção espiritual como partes da formação permanente dos novos e dos atuais presbíteros”, foi apresentada pelo padre Luiz Fernando Ribeiro Santana, mestre em teologia, pertencente ao clero do Rio de Janeiro e professor na PUC-Rio.
Trabalhando por quase três décadas na direção espiritual de leigos, religiosos e, de modo particular, com presbíteros, padre Luiz Fernando afirmou que a direção espiritual é parte integrante da formação permanente.
“É importante redescobrir o valor da direção espiritual na formação permanente dos presbíteros, sobretudo, na dimensão da escuta. Tem sido um desafio e um treinamento de colocar-se disponível no acolhimento, em cada encontro inteiramente único”, disse.
Recordando o Papa Francisco na Exortação “Evangelii gaudium” (n. 169), o padre Luiz Fernando discorreu em relação à direção espiritual e a “arte do acompanhamento”, na qual todos devem aprender a “descalçar as sandálias diante da terra sagrada do outro”.
“Precisamos aprender a entrar na terra sagrada do outro, uma espécie de sarça ardente. Com proximidade, respeito e compaixão, ajudar o outro a curar-se, libertar-se e amadurecer na vida cristã”, disse.
Servo de Deus
No dia 29 de janeiro, na programação do curso, os bispos visitaram o túmulo do Servo de Deus Guido Schäffer, instalado na Paróquia Nossa Senhora da Paz, em Ipanema. Durante a visita, que foi concluída com a Oração de Vésperas, presidida pelo arcebispo de Pouso Alegre (MG), Dom José Luiz Majella Delgado, os bispos ouviram o testemunho de Nazareth Schäffer, mãe do Servo de Deus, que foi médico e seminarista, e o andamento do processo feito pelo delegado arquidiocesano para a causa dos santos, Dom Roberto Lopes, OSB.
Próximo curso
O Curso dos Bispos de 2021 acontecerá de 25 a 29 de janeiro, no mesmo local, cujo tema será em torno da catequese. Um dos conferencistas será o presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, no Vaticano, Dom Rino Fisichella.
Agradecimentos
A missa conclusiva foi presidida por Dom Orani, que agradeceu o empenho do cônego Cláudio dos Santos e de sua equipe da coordenação de pastoral, pela infraestrutura do curso tão bem conduzida. Também agradeceu à equipe dos seminaristas e diáconos pela assessoria no acolhimento e liturgia, às irmãs da Congregação de Nossa Senhora do Bom Conselho, aos funcionários do Sumaré e aos colaboradores do Setor de Comunicação.
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Colaboração: Carlos Moioli – ArqRio