A comemoração do 7 de setembro gera oportunidades para análises mais aprofundadas sobre a realidade brasileira, com suas luzes e sombras, os interesses que circulam em várias direções e os grandes desafios que a nação enfrenta, ou melhor, que cada brasileiro no seu dia a dia deve enfrentar. Ao se falar de nação o nosso olhar não pode se desviar dos indivíduos e das famílias que constituem a base de toda a sociedade brasileira.
Não pretendo aqui entrar em análises sociopolíticas, aliás nem é de minha competência. No entanto, a ocasião é propícia para recordar uma contribuição específica que a Igreja católica pode oferecer, através do seu ensino social, para a construção de relações justas, tão importantes para a saúde de qualquer sociedade e para uma boa convivência entre as pessoas. Vivemos tempos que requerem posicionamentos de conciliação e diálogo e em que o bem comum seja verdadeiramente buscado.
A doutrina social da Igreja não é um sistema de estratégia governamental para oferecer uma opção a mais de forma de governo, mas sim um conjunto de princípios que, partindo do Evangelho e da experiência, oferece elementos adequados a ajudar as pessoas a viverem de uma maneira mais humana e fraterna.
Os tempos modernos trouxeram consigo a necessidade da Igreja católica posicionar-se mais frequentemente sobre as questões sociais, a fim de ajudar os seus fieis a terem critérios, de acordo com o Evangelho, sobre a atuação do cristão na sociedade. Em 1891, o Papa Leão XIII, ao escrever a Rerum novarum, deu início a uma série de intervenções dos Sumos Pontífices que constitui um corpo consistente sobre o pensamento social da Igreja Católica. Naquele documento, tratou-se da situação dos trabalhadores diante das injustiças geradas pela revolução industrial e criticando os materialismos comunista e capitalista. Os anos posteriores confirmaram os prognósticos do Papa acerca dos sofrimentos que as injustiças sociais geram na vida dos trabalhadores e do mundo.
Mais recentemente, esse pensamento foi condensado numa publicação chamada de Compêndio da Doutrina Social da Igreja de fácil acesso, com publicação inclusive digital. O Papa Francisco, em seus pronunciamentos, e particularmente na Encíclica Laudato Si, tem oferecido uma interessante reflexão sobre as relações entre as grandes questões sociais do nosso tempo e o cuidado com a casa comum, o meio ambiente.
Interessa-nos ter referências, diante do caos social que parece espalhar-se em todos os setores da sociedade. Não apenas os cristãos, mas muitos estudiosos têm se interessado por esse ensino social da Igreja, uma vez que, baseado na luz do Evangelho, considera também como fonte de sua reflexão o direito natural. Entre os católicos há um interesse novo de ter acesso a essas fontes. Em muitos lugares surgem as chamadas Escolas de fé e cidadania com o intuito de sistematizar esse acesso e formar lideranças capazes de contribuir positivamente com sua atuação comprometida com as pessoas. Sentimos cada vez mais a necessidade de que todos se empenhem na reconstrução do tecido social, hoje tão dilacerado. Mais que nunca temos consciência do valor da ética nessa tarefa. O cristianismo compartilha com todas as culturas o que nelas representa forças do bem viver entre os seres humanos. Na base desses princípios está o elemento fundamental da afirmação da dignidade da pessoa humana. Dele decorrem outros tão apreciados quanto raros: o interesse pelo bem comum, a solidariedade, o destino universal dos bens, a participação, a subsidiariedade, os valores, principalmente a verdade, a liberdade, a justiça e o amor. Através do desenvolvimento desses princípios nas distintas relações sociais o que se pretende é, precisamente, defender e oferecer apoio para que a dignidade própria e única da pessoa humana seja respeitada, cresça e se desenvolva.
DOM GILSON ANDRANDE DA SILVA
Bispo Diocesano de Nova Iguaçu (RJ)